No primeiro semestre de 2017 pedidos de danos morais aparecem em 188,9 mil processos, situando-se na 14.ª posição dos assuntos mais recorrentes da Justiça do Trabalho.
Apesar de a Justiça do Trabalho estar abarrotada de ações envolvendo pedidos absurdos de ressarcimento de dano moral, as associações de juízes trabalhistas continuam criticando as medidas adotadas pela reforma trabalhista para acabar com expedientes usados por trabalhadores para tentar auferir renda indevida à custa dos empregadores.
No direito do trabalho, o dano moral resulta de uma causa constrangedora, que pode ocorrer por meio de palavras, atos e gestos de superiores hierárquicos. Numa advertência, por exemplo, não é incomum que o supervisor de uma determinada área de uma empresa repreenda – elevando a voz – um trabalhador que cometeu algum equívoco. O dano moral se configura quando há desproporção entre o tom e a forma da repreensão e o erro cometido.
O problema é que, como a fronteira entre o tom respeitoso e o tom desrespeitoso é fluida, raramente baseada em provas fundamentadas, os empregados – industriados por advogados espertos – podem reclamar que qualquer medida disciplinar adotada pelos empregadores enseja dano moral. Com isso, esse instituto jurídico acabou sendo banalizado e estimulou a litigância de má-fé.
No Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2.ª Região, com jurisdição sobre a Grande São Paulo e a Baixada Santista, há pedidos de indenização em cerca de 10% das 488 mil ações protocoladas em 2016. Segundo o Tribunal Superior do Trabalho (TST), no primeiro semestre de 2017 pedidos de danos morais aparecem em 188,9 mil processos, situando-se na 14.ª posição dos assuntos mais recorrentes da Justiça do Trabalho.
Como entre as justificativas invocadas para justificar “dor moral, com sofrimento indenizável” há até a alegação de falta de opções de suco nas refeições, alguns TRTs passaram a entender que “dissabor, aborrecimento, mágoa ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, por não terem intensidade suficiente para romper o equilíbrio psicológico do trabalhador”.
Na mesma linha, a reforma da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) aprovada há dois meses pelo Congresso introduziu duas inovações para coibir a litigância de má-fé e desestimular pedidos de dano moral embasados em argumentos risíveis. A primeira impede que herdeiros de trabalhadores ajuízem processos por dano moral contra os empregadores.
A segunda inovação foi estabelecer quatro níveis de indenização, segundo sua gravidade, vinculando-os à remuneração das vítimas de danos morais. Para os casos de natureza leve, a indenização é de até três vezes a última remuneração. Nos casos de natureza média, de até cinco salários. Para os casos graves, são vinte salários. E, para os casos gravíssimos, cinquenta vezes a última remuneração. No caso de reincidência, o valor da indenização poderá ser dobrado.
Apesar de as duas inovações reforçarem a segurança jurídica nas relações trabalhistas, elas foram mal recebidas por associações de juízes. Esquecendo-se de que uma nova lei se sobrepõe à jurisprudência firmada com base na lei antiga, elas alegam que a primeira inovação colide com o entendimento dos atuais ministros do TST sobre a matéria. E reputam a segunda inovação de inconstitucional, por ferir o princípio do livre convencimento da magistratura.
Também afirmam que a imposição de quatro níveis de indenização introduz uma “classificação por castas” em matéria de danos morais. “O juiz tem de ter liberdade para dizer qual será a compensação”, diz o presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, Guilherme Feliciano.
Nenhum desses argumentos é convincente. Deixar a fixação dos valores ao livre-arbítrio dos juízes é sempre arriscado, já que vários, por viés ideológico, justificam a imposição de indenizações milionárias em nome da justiça social – e não por questões técnico-jurídicas. Além disso, o estabelecimento de critérios objetivos tem a vantagem de deixar claro aos trabalhadores o que podem ou não receber numa ação por dano moral e de propiciar às empresas um cálculo mais preciso do que terão de pagar.
Via: Estadão
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